Dia 16 – Adolescente com Down não pode ser infantilizado e precisa ter autonomia

Dia 16 - Adolescente com Down não pode ser infantilizado e precisa ter autonomia

Mãe do adolescente com síndrome de Down Geanderson Ferreira da Silva, 13 anos, Silvana Ozelia costuma dizer ao filho que ele precisa ter responsabilidade e saber se virar. “Falo que ele logo se tornará um adulto e que não estarei aqui para sempre. Por isso, é ele quem faz algumas tarefas da casa, como guardar a louça e arrumar a cama”, diz ela. Silvana não infantiliza o filho e faz com que ele participe dos afazeres cotidianos para desenvolver autonomia. No entanto, muitos pais de adolescentes com Down acabam não tendo esse comportamento.

“Ainda existe a visão de que a pessoa com deficiência intelectual é uma eterna criança, e isso não é verdade. O incentivo para participar do cotidiano deve começar desde criança”, afirma a pediatra Ana Cláudia Brandão, coordenadora do Centro Integrado de Atendimento à Criança e ao Adolescente com Síndrome de Down do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo.

A infantilização, geralmente, é consequência da superproteção. “Muitas vezes, não por não confiar no filho, mas por não confiar na sociedade, os pais o protegem demais”, diz a psicóloga Edinete Sousa, do Serviço do Apoio Socioeducativo da Apae (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) de São Paulo. Segundo ela, é comum que os adultos não saibam lidar com os desejos do jovem com Down e acabem reprimindo-o e prejudicando seu desenvolvimento. 

Além de aprender a lidar com os novos anseios do filho, os pais também precisam saber que, como todo adolescente, ele também apresentará uma mudança de temperamento, mostrando-se mais rebelde e contestador. “Os picos hormonais acontecem da mesma forma, tornando-o mais teimoso e questionador, e é preciso mais jogo de cintura por parte dos responsáveis”, afirma Ana Cláudia.

O adolescente com síndrome de Down Geanderson Ferreira da Silva, de 13 anos, beija a mãe, Silvana Ozelia - Junior Lago/UOL - Junior Lago/UOL
Silvana Ozelia não infantiliza a educação de GeandersonImagem: Junior Lago/UOL

Amizades e namoros

Geanderson adora festas, principalmente aquelas nas quais pode dançar forró. Ele já mostra interesse por meninas e diz para a mãe que quer uma namorada, mas Silvana acha que ele é muito novo. “Ele fará 14 anos em outubro, mas, para essas coisas, sempre achamos que nossos filhos são bebês.”

Ter bons amigos e sentir que faz parte de um grupo é fundamental para todo jovem, principalmente no período da adolescência. “Todos passamos por uma fase na qual precisamos procurar alguém que curte o que a gente curte, veste o que a gente veste”, diz o geneticista e pediatra Zan Mustacchi, responsável pelo Departamento de Genética Médica do Hospital Estadual Infantil Darcy Vargas, também na capital paulista, e especialista em síndrome de Down.

Por isso, a família deve, não só permitir, mas também criar condições para que o jovem faça amizades. “A família tem de levar o adolescente a festas, permitir viagens com a escola e outras situações nas quais há alguém responsável por observar e dar um suporte, caso seja necessário. Os pais de que acreditar que ele cresceu e pode se virar”, afirma a coordenadora do Centro Integrado de Atendimento à Criança e ao Adolescente com Síndrome de Down do Einstein.

Para ter essa confiança, o principal é estabelecer um diálogo com o adolescente. “O filho precisa confiar nos pais para poder contar as coisas que acontecem quando a família não está por perto, incluindo casos de bullying, situação a qual o jovem com Down acaba ficando mais vulnerável”, fala Edinete.

Além da escola, os locais que o adolescente com Down costuma frequentar, como clínicas de fonoaudiologia ou fisioterapia, também são possibilidades para que novas amizades surjam. “Muitos acabam tendo uma turma de amigos que também têm a síndrome. Isso não é fundamental, mas é legal que alguém no grupo também tenha. Isso vai permitir que ele descubra melhor sua sexualidade”, diz Ana Cláudia. “É bom que ele tenha alguém com quem possa ficar, namorar, e, geralmente, isso acontece com outra pessoa com Down. Ele precisa passar por isso, como todos os adolescentes.”

E, nessa fase, o jovem certamente terá vontade de sair sozinho com amigos ou com o namorado. Segundo os especialistas, isso pode e deve acontecer, mas é preciso uma preparação gradual, que deve se iniciar na infância. “Deve haver um treinamento, um ensino passo a passo para que ele pegue um ônibus sozinho, para que vá ao cinema. No começo, você vai junto e compra o ingresso. Depois, dá o dinheiro e o observa comprar. Só então vai deixá-lo na porta do shopping sozinho”, fala Ana Cláudia.

Para Zan Mustacchi, é importante que, ao sair sozinho, o jovem tenha um celular para que os pais possam ligar às vezes e acompanhar o que ele está fazendo. “Todo casal quer privacidade, quer ir ao parque, ao cinema, a um restaurante. Ele tem esse direito, mas é preciso garantir que tudo seja feito de maneira segura”, diz. Por isso, ele também recomenda que os pais não estejam em bairros distantes quando o filho for passear, pois, caso ele precise, eles conseguem rapidamente ir a seu encontro.

Educação sexual

De acordo com Ana Cláudia, é importante que os adultos conversem de forma transparente sobre sexo com os filhos. “Se a conversa ficar nas entrelinhas, a mensagem não será captada. Ele precisa de exemplos, saber claramente o que se faz com a namorada, mas não com uma amiga”, diz ela.  “Há o estereótipo de que a pessoa com Down tem a sexualidade exacerbada. Não é verdade. Isso só acontece quando há má orientação”, afirma Ana Cláudia.

Para explicar sobre sexualidade, a melhor maneira é contar com o auxílio de imagens. “É importante expor as particularidades de cada sexo, mostrar bonecos que o façam entender as diferenças entre o corpo de um homem e de uma criança”, diz Mustacchi. E, claro, a conversa sobre DSTs (doenças sexualmente transmissíveis) e a necessidade do uso da camisinha não pode ser deixada de lado.

De acordo com a psicóloga Edinete, do Serviço do Apoio Socioeducativo da Apae de São Paulo, a educação afetiva e sexual é fundamental para que haja inclusão social do jovem com Down.

Ana Cláudia, do Einstein, afirma que as conversas ajudam o adolescente a amadurecer. “Quanto maior a autonomia e o poder de escolha do jovem em todas as áreas da vida, mais bem resolvido ele será quando adulto”, afirma.

Fonte: UOL

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